quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Discurso

Não tinha um adjetivo para o dia e desejei ficar triste.
Fui moer lembranças,
Remoê-las com a areia pobre mas grossa de minha desmesurada moela.
Em mim, tanto faz meu coração ou estômago,
Já que nem pra rezar eu sei partir-me.
Como quem junta espigas pro moinho,
Juntei uns cheiros de alho, de álcool, de sabonete,
Um cheiro-malva de talco, uns gritos,
Fezes que se pisou ao redor da casa com cheiro não tanto repudiável
podia-se limpá-las, mas não eram execráveis
a incúria colateral de vários pâncreas, o trypanosoma cruzi, várias cruzes no sangue, no exame,
na forma de levantar os braços e dizer:
“ Ó Pai, duro é este discurso, quem poderá entendê-los? “
Se abrisse um sol sobre esse dia incômodo,
Eu rapava com enxada os excrementos,
Punha fogo no lixo e demarcava mais fácil os contornos da vida:
Aqui é dor, aqui é amor, aqui é amor e dor,
Onde um homem projeta seu perfil e pergunta atônito:
Em que direção se vai?
É as vezes fazendo a barba ou insistindo no vinco de sua calça branca que ele quer saber.
É as vezes aparando as unhas, em nem sempre escolhidas horas,
Que ele tem a resposta.
Um adjetivo para o dia, explica.

Adélia Prado

quinta-feira, 28 de outubro de 2010



água em cima, céu embaixo: tempo de espera



Santo Agostinho costumava dizer que “a recompensa da paciência é a paciência”. De fato, aquele que persevera, que cultiva a paciência, tende a conseguir os objetivos que almeja. Entretanto, mais importante do que conseguir algo externo que se deseja, o melhor de tudo é que desenvolver a paciência tornará você uma pessoa muitíssimo mais virtuosa, Thania. O quinto hexagrama do I Ching surge lembrando que é preciso esperar um pouco. Você já inaugurou o movimento de conquista, já pôs as engrenagens em andamento, agora lhe resta esperar pacientemente que a planta brote. Justamente por isso, é importante que você não se permita levar por inseguranças infundadas, nem tampouco por uma tola ansiedade. Dê tempo ao tempo e tenha fé. As coisas acontecerão conforme você deseja, mas você precisará saber esperar e com o tempo perceberá que esta espera trouxe apenas prazer e felicidade. Muita paz de espírito advém de quando aprendemos a desenvolver as importantes virtudes da paciência. Siga em frente, com fé.
o futuro desta situação
O hexagrama de hoje possui uma ou mais linhas móveis. Isto significa que elas se transformam em suas opostas, dando origem a um novo hexagrama. Leia abaixo as perspectivas para seu futuro próximo. Entenda melhor

TERCEIRA LINHA MUTÁVEL: Há perigos concretos em seu caminho, Thania e, se você não tomar cuidado agora, terminará atraindo encrenca na certa. Nada de se fazer de vítima neste momento. À medida que os problemas surgirem, busque soluções práticas para eles.

SEXTA LINHA MUTÁVEL: Uma solução bem concreta lhe será apresentada, Thania, mas você não reconhecerá sua importância logo de cara. Talvez até lhe pareça que a solução é bizarra, mas se você der um pouco de atenção a ela, verá que é o melhor que poderia acontecer.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010


"Eu estou sempre aqui. Olhando pela janela, não vejo arranhões no céu nem discos voadores. Os céus estão explorados, mas vazios. Existe um biombo de ossos perto daqui. Eu acho que estou meio sangrando. Eu já sei, não precisa me dizer. Eu sou um fragmento gótico. Eu sou um castelo projetado. Eu sou um slide no meio do deserto. Eu sempre quis ser isso mesmo: um adolescente nu, que nunca viu discos voadores e que acaba capturado por um trovador de fala cinematográfica. Eu sempre quis isso mesmo: armar hieróglifos com pedaços de tudo, restos de filmes, gestos de rua, gravações de rádio, fragmentos de TV. Mas eu sei que os meus lábios são transmutação de alguma coisa planetária. Quando eu beijo eu improviso mundos molhados, aciono gametas guardados. Eu sou a transmutação de alguma coisa eletrônica. Uma notícia de Saturno esquecida, uma pulseira de temperaturas, um manequim mutilado, uma odalisca andróide que tinha uma grande dor, que improvisou com restos de cinema e com seu amor, um disco voador."

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

"O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço... "

Álvaro de Campos

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Cama e Mesa






Eu quero ser sua canção
Eu quero ser seu tom
Me esfregar na sua boca
Ser o seu batom...

O sabonete que te alisa
Embaixo do chuveiro
A toalha que desliza
No seu corpo inteiro...

Eu quero ser seu travesseiro
E ter a noite inteira
Pra te beijar durante
O tempo que você dormir
Eu quero ser o sol que entra
No seu quarto adentro
Te acordar devagarinho
Te fazer sorrir...

Quero estar na maciez
Do toque dos seus dedos
E entrar na intimidade
Desses seus segredos
Quero ser a coisa boa
Liberada ou proibida
Tudo em sua vida...

Eu quero que você me dê
O que você quiser
Quero te dar tudo
Que um homem dá
Pra uma mulher
E além de todo esse carinho
Que você me faz
Fico imaginando coisas
Quero sempre mais...

Você é o doce
Que eu mais gosto
Meu café completo
A bebida preferida
O prato predileto
Eu como e bebo do melhor
E não tenho hora certa
De manhã, de tarde
À noite, não faço dieta...

Esse amor que alimenta
Minha fantasia
É meu sonho, minha festa
É minha alegria
A comida mais gostosa
O perfume e a bebida
Tudo em minha vida...

Todo homem que sabe o que quer
Sabe dar e querer da mulher
O melhor e fazer desse amor
O que come, o que bebe
O que dá e recebe...

Mas o homem que sabe o que quer
E se apaixona por uma mulher
Ele faz desse amor sua vida
A comida, a bebida
Na justa medida...

O homem que sabe o que quer
Sabe dar e querer da mulher
O melhor e fazer desse amor
O que come, o que bebe
O que dá e recebe...

Mas o homem que sabe o que quer
Sabe dar e querer da mulher
O melhor e fazer desse amor
O que come, o que bebe
O que dá e recebe...

Mas o homem que sabe o que quer
E se apaixona por uma mulher
Ele faz desse amor sua vida
A comida, a bebida
Na justa medida...

Roberto Carlos

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Chorinho Doce

Eu já tive e perdi
uma casa,
um jardim,
uma soleira,
uma porta,
um caixão de janela com um perfil.
Eu sabia uma modinha e não sei mais.
Quando a vida dá folga, pego a querer
a soleira
o portal,
o jardim mais a casa,
o caixão de janela e aquele rosto de banda.
Tudo impossível,
tudo de outro dono,
tudo de tempo e vento.
Então me dá choro, horas e horas,
o coração amolecido como um figo na calda.

Adelia Prado

quinta-feira, 19 de agosto de 2010


um dia
a gente ia ser homero
a obra nada menos que uma ilíada
depois
a barra pesando
dava pra ser aí um rimbaud
um ungaretti um fernando pessoa qualquer
um lorca um éluard um ginsberg
por fim
acabamos o pequeno poeta de província
que sempre fomos
por trás de tantas máscaras
que o tempo tratou como flores

Paulo Leminski

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Fico assim sem você


Avião sem asa, fogueira sem brasa
Sou eu assim sem você
Futebol sem bola,
Piu-Piu sem Frajola
Sou eu assim sem você

Por que é que tem que ser assim
Se o meu desejo não tem fim
Eu te quero a todo instante
Nem mil alto-falantes
vão poder falar por mim

Amor sem beijinho
Buchecha sem Claudinho
Sou eu assim sem você
Circo sem palhaço,
Namoro sem amasso
Sou eu assim sem você

Tô louca pra te ver chegar
Tô louca pra te ter nas mãos
Deitar no teu abraço
Retomar o pedaço
Que falta no meu coração...

sexta-feira, 28 de maio de 2010

do início.. ou seria o meio?

“ e como se eu estivesse , enfim, chegado em casa...”
e mesmo após um segundo olhar pudesse perceber as janelas ainda fechadas,
resolvi me guiar pela fresta de luz da porta entreaberta. Entrei!
por um instante pensei poder Ir limpando calmamente as peças,
retirando o mofo pra deixar vir o brilho.
Me detive diante de lindo livro branco e pus a folhear linha por linha calmamente
ate agora posso senti-las nas pontas dos meus dedos.
Doce e suave leitura.
quieta espero que as janelas se abram também com a mesma calma.
Quieta espero que a casa acolha o viajante que viera noites e dias, chuva e sol fazer morada.
Encontrar pouso, plantar flores, pendurar na soleira os pés cansados
e deixar que venham os frutos ate que passe o inverno e outra vez chegue a primavera.

Thania Furbino
30 de setembro de 2008

Das antigas parte 1

IV
Ando com vontade de poesia
Saudade dela deslizando em minha veia
misturada ao sangue quente (como antigamente?) poesia obstruindo meus poros
cegando meus olhos
Ando com vontade de poesia
Vontade de comê-la
Bebê-la
Saudade de poesia...
poesia – cheiro
Poesia-lembrança
Poesia-rima
Poesia-toque
Ando com vontades!


Thania Furbino 21/05/2009

terça-feira, 13 de abril de 2010

Poema da necessidade

É preciso casar João,
é preciso suportar, Antônio,
é preciso odiar Melquíades
é preciso substituir nós todos.

É preciso salvar o país,
é preciso crer em Deus,
é preciso pagar as dívidas,
é preciso comprar um rádio,
é preciso esquecer fulana.

É preciso estudar volapuque,
é preciso estar sempre bêbado,
é preciso ler Baudelaire,
é preciso colher as flores
de que rezam velhos autores.

É preciso viver com os homens
é preciso não assassiná-los,
é preciso ter mãos pálidas
e anunciar O FIM DO MUNDO.

C.D.A

segunda-feira, 12 de abril de 2010




Hoje estou velha como quero ficar.
Sem nenhuma estridência.
Dei os desejos todos por memôria
e rasa xícara de chá.

Adélia Prado

quarta-feira, 10 de março de 2010

Choro e capela

O poder que quisera é dominar meu medo.
Por este grande dom troco meu verso, meu dedo,
meus anéis e colar.
Só meu colo não ponho no machado,
porque a vida não é minha.
Com um braço só, uma só perna,
ou sem os dois de cada um, vivo e canto.
Mas com todos e medo, choro tanto
que temo dar escândalo a meus irmãos.
Mas venho e vou,
"os lobos tristes" a seu modo louvam.
Nasci vacum, berro meu
era só por montar, partir, a boa fome,
os júbilos ferozes.
As vacas velhas têm os olhos tristes?
Tristeza é o nome do castigo de Deus
e virar santo é reter a alegria.
Isto eu quero.

Adélia Prado

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Eu quero é botar meu bloco na rua



Há quem diga que eu dormi de touca

Que eu perdi a boca, que eu fugi da briga

Que eu caí do galho e que não vi saída

Que eu morri de medo quando o pau quebrou



Há quem diga que eu não sei de nada

Que eu não sou de nada e não peço desculpas

Que eu não tenho culpa, mas que eu dei bobeira

E que Durango Kid quase me pegou



Eu quero é botar meu bloco na rua

Brincar, botar pra gemer

Eu quero é botar meu bloco na rua

Gingar, pra dar e vender





Eu, por mim, queria isso e aquilo

Um quilo mais daquilo, um grilo menos disso

É disso que eu preciso ou não é nada disso

Eu quero é todo mundo nesse carnaval...



Eu quero é botar meu bloco na rua

Brincar, botar pra gemer

Eu quero é botar meu bloco na rua
Gingar, pra dar e vender

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Os Cegos do Castelo




Eu não quero mais mentir
Usar espinhos que só causam dor
Eu não enxergo mais o inferno que me atraiu
Dos cegos do castelo me despeço e vou
A pé até encontrar
Um caminho, o lugar
Pro que eu sou
Eu não quero mais dormir
De olhos abertos me esquenta o sol
Eu não espero que um revólver venha explodir
Na minha testa se anunciou
A pé a fé devagar
Foge o destino do azar
Que restou...

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010


Para uma nova gramática


imagine um sentimento água. um sentimento árvore.
uma agonia vidro. uma emoção céu. uma espera pedra.
um amor manga. um colorido vento sul. um jeito casa
de ser. uma forma líquida de pensar. uma vida paredes.
uma existência mar. uma solidão cordilheira. uma alegria pássaro em chuva fina. uma perda corpo.
acho que hoje acordei semente. tenho andado muito temporal. minha irmã vive um momento tudo.
a vida às vezes transborda pelos poros. me atinge um estado livro. aurora em meus joelhos. tem pessoas ponte.
algumas carregam a gravidade nas costas. já conheci gente buraco negro. Eu amo o instante limo. Tem um branco em mim. Sofro de saudade anônima. Palavras me beijam a boca.

Viviane Mosé

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

gambazim .. lov u


Quando a gente quer muito uma coisa e vai querendo e ajudando, Deus concede o que você quer. Guimarães também já dizia isso.
Você é o meu presente ... diário!
Feliz por compartilhar, por sentir todo dia seu carinho por mim.